domingo, 22 de junho de 2014

Jungle Boy, o Garoto da Selva



Embora as chances de assistir a um longa metragem animado centrado no Quênia atualmente fiquem melhores a cada dia, graças à crescente exposição de animadores locais e artistas digitais que surgem nos dias atuais, quais seriam as chances de encontrar algo assim em pleno anos 1980? Quase zero, certo? Bom, não exatamente. Haruki Kadokawa, um produtor japonês, pegou um mangá de sua infância, nos anos 1950, chamado Shounen Kenya (Menino Quênia, literalmente) e decidiu adapta-lo para um anime em 1984. Ele contou com a ajuda do diretor Nobuhiko Obayashi, mais conhecido por seus clássicos live-actions experimentais como House (filme de 1977, onde sete garotas em sua viagem de verão visitam uma casa possuída que pretende devorá-las de maneiras extremamente bizarras e surreais).



A premissa de Jungle Boy – O Garoto da Selva talvez seja a única coisa que realmente faz sentido: estamos em 1941, Bwana Murakami é um comerciante japonês que comercializa produtos têxteis em Nairóbi (capital do Quênia, desde sua independência do Reino Unido em 1963). Ele decide levar seu filho, Wataru, num safári pela savana, deixando sua esposa para trás. O momento da viagem não é o mais propício porque a Segunda Guerra Mundial entra numa nova fase quando o Japão declara guerra aos Aliados (Estados Unidos, União Soviética e Reino Unido). Eles automaticamente viram inimigos dentro do solo britânico. Como resultado, seus funcionários os abandonam na selva, temendo serem presos pelos britânicos. Como se isso não bastasse, eles são atacados por um rinoceronte em fúria, forçando-os a se separarem. Desse ponto em diante, as coisas tomam um rumo muito estranho.



Wataru se mete em várias aventuras fantásticas que se sucedem num ritmo alucinado e jogam pela janela toda a precisão histórica da premissa. Ele salva a vida de um chefe guerreiro Maasai chamado Zega que dedica sua vida a moldar Wataru num poderoso guerreiro e ajuda-lo a encontrar seu pai. Seguindo em frente, ele resgata uma jovem escocesa chamada Kate das garras de uma estranha tribo africana que acredita que ela é uma espécie de deusa. Ele torna a salva-la quando Kate é seqüestrada por outro grupo chamado Tribo do Lagarto.

Essas aventuras não se passam nas planícies que você normalmente veria se visitasse o Masai Mara - provavelmente o parque/reserva mais famoso do Quênia -, seja hoje ou em 1941. Não, este é um lugar repleto de répteis tão gigantescos quanto crocodilos, uma cobra do tamanho de um edifício de 10 andares e provavelmente o maior sapo já visto num filme. Não importa que depois Wataru e seus amigos se deparem com uma estação de pesquisas Nazista desenvolvendo a primeira bomba atômica do mundo bem no coração de uma África ocupada pelos britânicos. Ah, sem mencionar os dinossauros que também resolvem dar as caras por aqui. Imagine que “Entre Dois Amores” (Out of Africa, 1985) encontrou “Jungle Boy” (Bomba, The Jungle Boy é um menino selvagem criado nas florestas) e eles tiveram um filho ilegítimo que parece uma mistura de “John Carter” (criação de Edgar Rice Burroughs) e “Parque dos Dinossauros” (Jurassic Park, 1993). Loucura, loucura, loucura! De fato, o clímax dos 10-20 minutos finais de O Garoto da Selva é o momento mais inexplicável do filme, o que leva a mais perguntas alucinantes do que respostas.

O roteiro acaba sendo prejudicado pelas muitas inconsistências nos estilos de animação que aparecem aleatoriamente ao longo do filme. Antes que você perceba, o filme muda para desenhos em preto e branco, a lápis ou giz de cera e até imagens de 8 bits de pixels sem você ter nenhuma noção de quando esperar essas mudanças. Alguns dos personagens se quer estão coloridos enquanto outros - como alguns dos guerreiros que enfrentam Wataru e Zega – mudam a cor da pele de preto para branco.



Infelizmente, mesmo que haja um momento de tédio neste filme, dificilmente haverá um momento sequer de sanidade. Com certeza, a estória serviria como um bom material de propaganda para o Japão dos anos 1950 e 1960 após a sua derrota esmagadora na Segunda Guerra Mundial, mas alguns dos tons de ufanismo (auto-vangloriação de um país) e estereótipos raciais acabaram ficando hilários ou simplesmente irritantes. Os nativos estão sempre prontos a reconhecer a força, bravura e humildade do povo japonês. Tribos inimigas são mostradas como idiotas sem noção, incapazes de uma estratégia sensata. As cenas de luta em que Wataru se envolve são desequilibradas, fazendo imaginar como um menino japonês que acabou de receber treinamento conseguiria derrotar tão facilmente um bando de guerreiros africanos dentro do seu próprio território!?.


O mangá de Soji Yamakawa, já havia inspirado o tokusatsu Shounen Kenya (少年ケニヤ, 1961-1962, 42 episódios). No Brasil, o longa chegou a ser lançado no mercado de vídeo, em formato VHS.


.:: CONCLUSÃO ::.

O Garoto da Selva, mesmo com sua estória ultrajante e animação casual, ainda proporciona uma diversão agradável, desde que você admita que este é um daqueles filmes que nunca farão qualquer sentido. Preste atenção nos 20 minutos finais!

Ficha técnica

Título original: 少年ケニヤ
Produção: 1984
Produtora: Toei Animation
Direção: Tetsuo Imazawa, Nobuhiko Ôbayashi
Trabalho original: Soji Yamakawa (mangá)

Fontes:
Bottom Line!
ComicVine: Bomba The Jungle Boy
Wikipedia: Masai Mara
Wikipedia: Nairóbi
Info Escola: Segunda Guerra - Aliados

1 comentários:

Humberto Costa disse...

Filme importantíssimo da minha infância. Obrigado por esta lembrança.

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